Há mais de um ano meu blog parou. Para explicar o porquê
acho melhor começar lá pelo começo, ou melhor, lá pelo como ele começou. Pois
bem. Ele começou assim: um operário do setor financeiro, no caso eu, trabalhava
dezesseis horas por dia numa empresa. Era uma espécie de suprimento de
necessidades básicas misturada com autoflagelação. Uma vez convidado a se retirar desta mesma
empresa, encontrei-me de volta ao Paraíso (ao bairro, não à utopia). Minha mãe,
como a maioria das mães o fariam, aceitou receber o rebento balzaquiano, financeiramente
fracassado, de volta ao ninho. Ali, considerando o choque da mudança de
dezesseis horas diárias de labuta para absolutamente nada para fazer, ressurgem
as questões filosóficas e existenciais. Escrever se tornou uma das maneiras de
não enlouquecer.
Os quase dois anos que passei na casa da minha mãe
estudando para o concurso do Banco Central foram, por razões óbvias, os mais
férteis na produção de textos. Como bem
dizia o meu velho tio-avô Orígenes Lessa em seu “O feijão e o sonho”, não dá
para escrever boa poesia e pensar no dinheiro do arroz ao mesmo tempo. O mais
engraçado é que esse dois anos tinham todos os ingredientes para cozinhar a
maior depressão da minha vida. Estava com pouco dinheiro, sem renda, sem
emprego, sem namorada, sem perspectiva profissional. Ironicamente, posso dizer
sem medo de errar que foi um dos períodos mais felizes da minha vida. Primeiro,
simplesmente por não estar trabalhando e enterrar de vez a noção da ética
protestante, herdada pelos dois lados da família, de que o trabalho enobrece. Segundo, por descobrir, de maneira
besta e improvável, que as pessoas gostavam do que eu escrevia.
Mas toda lua-de-mel sempre acaba. Tristeza não tem fim,
felicidade sim, e coisa e tal. Chegou um ponto em que a coisa foi perdendo o
sentido. O primeiro “toque” em relação ao blog foi a reação aos ímpetos
literários. Quando eu me meti a besta de publicar alguns contos no Blog, recebi
comentários do tipo: “Pô, Iatã, eu entrava no seu blog antes de começar a
trabalhar, para dar umas risadas, geralmente depois de ver as notícias do UOL
Esporte. Agora você vem com essas profundezas literárias... Assim não dá. Isso
é coisa para ler em casa com calma”. Eu achei ótimo esse comentário. Ler em
casa com calma é algo como aquele quadro da Revista MAD dos anos oitenta: o que
ele disse X o que ele quis dizer. O que ele disse: “Vou ler em casa com calma”.
O que ele quis dizer: “Não vou ler essa merda nem fodendo!”.
Constatadas estas constatações, decidi guardar meus
sinceros ímpetos literários no HD do meu computador, onde ora se encontram e
acumulam, reservando o blog para brindar o mundo com minhas visões brilhantes
sobre o mundo. Foi aí que a coisa toda brochou, e não há Viagra que a faça
levantar. Dar opinião no mundo de hoje se tornou a coisa mais entediante,
chata, modorrenta e careta que se pode imaginar. Todo mundo hoje tem uma
opiniãozinha. Se eu soubesse desenhar, teria criado um personagem, no estilo
daqueles do Henfil, chamado “Opiniãozinha”. Imbecilidades não faltam. Elas
inundam nosso dia-a-dia no Facebook, no Twitter e em todas as coisas mais. Pior
são os comentários de notícias e blogs famosos, anônimos e covardes.
Eu não tenho nada para dizer nesse Blog que acrescente
alguma coisa. Todo mundo sabe minha opinião. Um esquerdista na adolescência que
estudou economia e matemática e virou direitista. Que original! Parece o
comentário do judeu Wolowitz, da série “Big Bang Theory” dizendo: “Wow! A
jewish comediant making stand-up comedy! How original!”. Sim, eu odeio o PT,
sou contra cotas raciais, sou contra médicos cubanos ganhando duzentos reais no
Mais Médicos e mandando nove mil reais por mês pra Cuba e odeio Guido Mantega e
o considero um completo desqualificado para ser Ministro da Fazenda. Finalmente, não gosto de ser chamado de direitista
porque sou a favor do Bolsa-Família, sou a favor do casamento gay e de qualquer
outro direito social que não seja picaretagem demagógica de esquerdista
picareta. E sou a favor da prisão de qualquer corrupto, seja ele do PT ou de
qualquer outro partido. Aceito protesto em relação a ausência de condenação
para qualquer político que não seja do PT, mas criticar a condenação de petistas
por corrupção é, para mim, pura falta de
vergonha na cara. Pois é. Boooooring. Booooring no último.
O que resta? Esta pergunta me lembra a pergunta feita ao
filósofo João Gordo num programa de TV dos anos 90. O entrevistador inquiriu:
por que o Ratos do Porão não faz mais músicas? E o preclaro respondeu: sei lá,
vou falar sobre o que? Maçãs podres? Eu me faço a mesma pergunta todo dia. O
que existe além da liberdade da imaginação literária nos nossos tempos de
suposta liberdade democrática? A verborragia inútil no Facebook ou o prazer de
ironizar com metáforas e muitas outras figuras de linguagem? Acho que Nara Leão
teria morrido antes, de desgosto, se soubesse o que a Opinião seria em 2014.